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date: 2014-11-15T00:00:00-05:00
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title: "Brasil em Conserva"
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tags: [pt_br, thoughts, politics]
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As eleições brasileiras já acabaram, e talvez eu devesse me sentir mais
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à vontade pra falar do assunto do que realmente me sinto. Não sei, mas
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tenho a impressão de que, dessa vez, as coisas aconteceram de um modo um
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pouco diferente do que o de costume. Aliás, não acho que tenha sido
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“coisa de momento”, e tampouco acho que seja uma exclusividade
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brasileira: as pessoas estão ficando mais conservadoras, mais
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“endireitadas”. E eu vou tentar explicar, talvez pretensiosamente, por
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que eu não acho que isso seja bom.
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Nunca votei em candidato algum, em nenhuma eleição até hoje. Sempre me
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vi descrente das propostas apresentadas, ainda mais quando percebia que
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aqueles que davam rostos às propostas eram basicamente os mesmos. Por
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isso, nas primeiras eleições em que pude “exercer a cidadania em sua
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plenitude” (uma mentira deslavada contada pela imprensa, que talvez
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mereça outro post), lá no longínquo ano de 2002, decidi por anular meus
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votos. Depois disso, mudei-me de cidade, e não transferi meu título de
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eleitor porque, no final das contas, iria acabar votando nulo novamente.
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No entanto, e de uma maneira aparentemente contraditória, sempre
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interessei-me por política.
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Pode mesmo parecer contradição, mas eu nunca entendi como existiam
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pessoas (e são muitas!) que não queriam saber de política, e do que
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estava acontecendo no próprio país. Obviamente, essas mesmas pessoas em
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geral são as primeiras que reclamam do governo, ou que criticam um
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político, mesmo sem saber exatamente o porquê de fazerem isso. E quando
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vamos falar sobre política com elas, aquela velha máxima “Política não
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se discute!” vem à tona, e você de repente perde qualquer motivação para
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continuar conversando. Mas mesmo com toda essa minha “descrença-crente”
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com a política, nessas últimas eleições eu tive uma enorme vontade de
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votar.
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Meu voto não iria para o Aécio. E no primeiro turno, provavelmente eu
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não votasse em nenhum dos candidatos, como sempre fiz. Mas no segundo
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turno, senti que eu não podia deixar de ajudar a Dilma a ser reeleita,
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mesmo que isso não necessariamente signifique que eu a apóie e concorde
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com tudo o que seu governo tem feito. Mas, usando uma outra velha
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máxima, “dos males, o menor”.
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Considero-me uma pessoa com fortes tendências para as questões sociais.
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Não à toa defendo o Software Livre com empenho, porque acredito que se
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olharmos para todos, avançamos mais. Daí deriva minha antipatia pela
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maioria das causas individualistas, por acreditar que, apesar de ser
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totalmente plausível admitir que o ser humano é egoísta, não acho que
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devamos nos acomodar com essa constatação. E isso vai de encontro com o
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que o governo da Dilma (e o antigo governo do Lula) tem feito para o
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Brasil: avançar nas causas sociais. O crescimento que o país
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experimentou nos últimos anos foi, sim, muito perceptível para mim. E,
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quando tive a oportunidade de visitar o Nordeste brasileiro há alguns
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anos, pude ver que a situação por lá, apesar de ainda não ser a ideal,
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também melhorou bastante. Ou seja, o bolo finalmente está sendo dividido
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mais igualmente para todos, ainda que falte muito para que a divisão
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possa ser considerada boa.
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Mas não foi só na área social que eu vi mudanças. Apesar de já estar
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nascido na época da inflação galopante da década de 1980, não tenho uma
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noção muito grande do que era viver naquela época. Eu era criança, e
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crianças não se preocupam com o preço das coisas. No entanto, lembro-me
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de que a vida, naquela época, não era fácil. O planejamento familiar era
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tarefa ingrata, porque como planejar se você não sabe o preço das coisas
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amanhã? E a desigualdade social era muito mais acentuada, porque (por
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exemplo) era impossível pensar em viajar de avião, mesmo para uma
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família de classe média (Europa, então, era outro mundo). Mas daí veio o
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plano Real, e as coisas melhoraram... E obviamente muito do crédito por
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essa melhora vai para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e por
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sua política econômica que, pelo menos no começo do seu governo,
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conseguiu estabilizar as coisas de forma louvável. Mas, como pôde-se ver
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depois, Lula refinou a economia do antigo governo, e atrelou-a ao lado
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social, que por tanto tempo ficou esquecido.
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Um outro argumento que ouço e vejo muito, principalmente por aqueles que
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são anti-petistas declarados, é o da corrupção. Confesso que não entendo
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o motivo desse ódio tão grande a apenas uma parcela do governo
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brasileiro (o PT não toma conta do Brasil, ao contrário do que muita
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gente insiste em dizer). Esquecem-se que denúncias de corrupção sempre
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existiram, em todos os nossos governos, e que é contra ela (a corrupção)
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que devemos lutar, ao invés de escolhermos um partido específico? Quando
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escolhemos um alvo, estamos, de certa forma, dando salvo-conduto para os
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outros que cometem o mesmo crime. Para mim, quando ouço um “argumento”
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desse tipo, a vontade de discutir cai exponencialmente.
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Infelizmente, o argumento anti-petista passa por tantos outros absurdos
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(Venezuela, Cuba, bolivarianismo, comunismo), e é tão estúpido, que
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parece-me que a pré-condição para ser ouvinte dele é estar imerso na
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completa ignorância, principalmente a respeito desses termos. Se você
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souber o que é bolivarianismo ou comunismo, por exemplo, você já não
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pode ouvir o argumento, porque aí não vai acreditar nas conclusões. É
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algo tão impressionante e infantil que, novamente, fica difícil ter
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qualquer tipo de conversa com pessoas que repetem essas falácias como se
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fossem obviedades que estão aí, para qualquer um que queira vê-las.
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Todo esse tipo de conversa, ao meu ver, leva a apenas uma conclusão: o
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conservadorismo está se alastrando no mundo. No Brasil, ele está tomando
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proporções perigosamente grandes. Às vezes penso qual seria a melhor
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maneira de combatê-lo: educar não me parece ser uma solução muito
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efetiva, ainda mais quando estamos falando de pessoas que possuem uma
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condição social mais favorável, e que julgam-se instruídas e informadas.
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Por enquanto, a solução tem sido ignorar o problema, o que também não
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vem surtindo efeitos práticos, haja visto a escalada dos conservadores
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nessas últimas eleições. Contraditoriamente, talvez a solução fosse
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parar de lutar e deixar a água correr. Parece-me às vezes que a
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humanidade precisa mesmo repetir seus erros de modo cíclico, para
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reaprender o motivo pelo qual eles já foram corrigidos outras vezes.
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